domingo, 27 de agosto de 2017

Elucidações 
Maurício me surpreendeu pensativa, sentada na varanda.

—Em que a menina Patrícia pensa tanto?


Contei-lhe as narrativas que ouvi das três amigas e terminei por interpelá-lo.


—Por que não fui para o Educandário?


—É bom que pensa, medita para aprender. Você é muito adulta com os seus dezenove anos. E mais responsável que muitos idosos por aqui.


Achamos melhor você ter vindo para cá. Você tem muitos conhecimentos, o Educandário lhe pareceria uma escolinha para infantes.


—Sofre-se ao desencarnar por não ter conhecimentos do Plano Espiritual?


—Nem todos sofrem, por não terem conhecimentos Espíritas ou do Plano Espiritual. Conhecimentos só facilitam a adaptação. Mas a falta destes conhecimentos, da crença da verdadeira continuação da vida após a morte do corpo, acarreta muita perturbação e até sofrimento ao desencarnado e até mesmo para os encarnados que perderam o ente querido.


—Que me diz do sofrimento destas três amigas?


—O egoísmo é um peso, os que cultivam a matéria a ela ficam presos. Amélia sofreu, não foi má, mas deixou de fazer o Bem. O Bem a ela própria, como se instruir, entender a vida como um todo. Teve vícios e nem se esforçou para melhorar. A desencarnação foi um pesadelo, uma agonia. O que aconteceu a ela sucede com muitos: são os que se esquecem completamente da parte espiritual. 


Marina sofreu pelos mesmos motivos. Equivocam-se ao pensar que todos os Jovens são socorridos, somente pelo fato de ser jovem. Não estando nada preparada para enfrentar a mudança com a desencarnação, repeliu-a. Seus erros lhe pesaram na consciência. 

Infelizmente vemos muitos jovens delinqüentes.

Ser criança e jovem na matéria são fases. Sabemos que o espírito pode ser milenar. Os socorristas dedicam a máxima atenção para todas as crianças e jovens, mas infelizmente nem todos podem ser amparados.


Muitos necessitam entender através do sofrimento, para dar valor ao amparo recebido.


Maurício suspirou dando uma pausa e continuou:


—Isa, sendo boa, poderia ter sido socorrida e sentir-se bem logo que desencarnou, mas, como acreditava que ia ficar no corpo dormindo, quis, desejou ficar. Nossa vontade é sempre respeitada.


 A história de Isa é comum, o sofrimento em desespero atormenta a todos. São muitos os jovens que passam o que ela passou. Quando os encarnados têm dó e só pensam nos desencarnados doentes, sofrendo, estes sentem. Estes têm mais dificuldades para livrar-se dos reflexos da doença, do sofrimento pelo qual desencarnaram.

Devem os encarnados pensar nos desencarnados sadios, felizes, e desejar-lhes alegria.

 Quando os encarnados não colaboram, os desencarnados necessitam de muito auxílio para superar esta fase difícil. Escutam chamá-los, como se as vozes dos familiares saíssem de dentro deles, querem atendê-los, querem ir para perto deles.

Eles choram lá e eles aqui. Muitas vezes, ficam internados somente por este motivo. Às vezes, aceitam a desencarnação, está tudo bem com eles, mas entram em crise todas as vezes que, em desespero, os encarnados chamam por eles. Depois ficam a lhes pedir favores. 


Não se deve pedir graças, favores aos familiares desencarnados, não se sabe se eles podem ou não fazê-los. Como no caso de Isa, ela, não podendo, sentia-se infeliz.

Mesmo se pudesse, não podemos pedir que façam a lição que nos cabe e nem que venham tomar nosso lugar nos bancos de provas.


Isa nem podia ajudar a si mesma, e se estivesse apta a ajudar, se já tivesse conhecimentos, não poderia atender todos os pedidos, não é bom fazer o que compete aos outros. A intervenção dos instrutores do Educandário no caso de Isa é muito justa. Para ajudá-la tentaram chamar seus familiares à realidade. Os orientadores do Plano Espiritual fazem muito esta ajuda, pensando nos seus pupilos.

Observe, Patrícia, que Isa sendo boa sofreu pela falta de compreensão, do entendimento da desencarnação, algo tão comum para todos.

—Comigo foi tão diferente!


—Você não é privilegiada, aqui está por afinidade, é pura de coração.


E não é por ter sido Espírita. (Os Espíritas, normalmente, estão entre aqueles aos quais muito foi dado e a quem muito será pedido. 


Os que deram valor ao que receberam terão em abundância.) Se não fosse boa e sem erros sua desencarnação não teria sido como foi. Se você, Patrícia, não fosse boa, poderia ter sido até uma dirigente de Centro Espírita, que não viria como veio. Está aqui porque você fez por merecer. Você não sentiu o que Isa sentiu, porque o ambiente de seus familiares é de compreensão. Todos buscam, no seu lar, o aperfeiçoamento que lhes dá condições de não se perturbar e assim ajudar você. Veja sua mãe: em vez de chamá-la para junto de si, oferta-lhe flores. Não as colhe, ou leva ao cemitério, pensa e manda-as. Seu pai, na sua desencarnação, lhe deu estímulo e sustentação psicológica.

Maurício silenciou. Sim, era verdade, meu pai me sustentava.


Recebia diariamente seus recados e orações: “Patrícia, alegre-se, a vida é linda, seja feliz!


Estamos bem, não se preocupe conosco. Faça o que os amigos lhe têm orientado, etc., etc.” Sempre obedeci meus pais. Achava e acho meu pai o “máximo”, prudente e sábio e seguia agora suas orientações.

—Maurício, quero trabalhar.


—E o fará. Logo que iniciar o curso de conhecimentos do Plano Espiritual, você irá fazê-lo. Este curso é realizado de dois modos, num período maior para os que não têm conhecimentos do Plano Espiritual, e em período menor para os que têm conhecimentos. Você fará o de  período mais curto. Irá gostar muito. Mas, enquanto espera, deseja fazer algo?


Bem, vamos ver. Que quer fazer? Quando desencarnou fazia dois cursos na Faculdade, Ciências e Matemática, como também lecionava para infantes. Quer lecionar, dar aulas?

—Lecionar aqui!?


—Você acha que só pelo simples fato de desencarnar se sabe de tudo? Quem era analfabeto encarnado, desencarna e continua sendo.


—Se em outras encarnações passadas sabia, não recorda quando desencarna?


—Nem sempre. Se em outras encarnações teve conhecimentos e na última foi analfabeto, poderá recordar. Mas esta lembrança poderá ser acompanhada de outras que talvez não lhe sejam convenientes no momento. Depois, para ter estas recordações o espírito precisa estar apto, preparado para isto. E quem está apto recorda quase sempre sozinho. Os desencarnados só recordam o passado para um entendimento, para aprendizado ou para realizar uma tarefa. Os que precisam recordar vão a departamentos próprios, lá os trabalhadores do local analisam e, se for realmente um Bem, ajudam-nos a recordar. Aqui, na Colônia, estes irmãos analfabetos têm oportunidades, facilidades para aprender. Há uma ala, na Escola, onde analfabetos que desencarnam adultos aprendem a ler e escrever. Você poderá ensiná-los, alfabetizando-os, enquanto espera o início do curso. Ensinará só os adultos, porque professores de crianças e jovens fazem parte do Educandário, necessitam de muitos conhecimentos.


Porque, professores, para eles, são exemplos, são aqueles que resolvem todos os seus problemas. Para adultos, o conhecimento é dividido em matérias e você os ensinará muito bem a ler e escrever.


Quer?

—Sim. Quero.

Maurício despediu-se e fiquei a pensar, recordei que papai sempre nos dizia sobre o saber: “O saber, que a maioria dos homens e espíritos tem como fim, deveria ser como meio, para que o homem possa evoluir até sua cosmificação. Nós, para vivermos na matéria, não precisamos saber ler, mas o saber facilita. Assim também o saber não realiza o homem espiritualmente, mas, sim, lhe dá condições de compreender e encontrar a bem-aventurança.”


Sim, queria estudar, aprender para ser útil com sabedoria e fiquei muito feliz em poder repartir desde já os poucos conhecimentos que possuía com outros irmãos.


Aguardei ansiosa a nova visita de Maurício que me levaria à escola para adultos.

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